quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Um negro na Casa Branca


Para quem ainda duvidava que os americanos elegeriam um presidente negro, eis a resposta: 349 delegados para Obama, 173 para McCain. Arrematando o eleitorado dos maiores estados norte-americanos (com a exceção do Texas, é claro), o democrata foi chamado de pioneiro, despreparado, pop e até de Osama, mas não se pode negar que ele seja, na verdade, um símbolo.

Seria difícil Malcom X acreditar nessa história se ela não tivesse se tornado a vedete da mídia internacional. Experimente abrir o site de qualquer veículo situado entre Vladivostok e a Terra do Fogo e verá o rosto do afroamericano em praticamente todos. A euforia global, em grande medida, se deve ao fracasso diplomático dos oito anos de Bush, que terminou com a pior popularidade da história dos EUA. O War President foi odiado dentro e fora de sua nação, e conseguiu piorar a já mal quista imagem do“Tio Sam”.

Obama surfou numa onda anti-republicana, e se manteve como favorito desde a disputa com a ex-primeira dama e quase candidata Hillary Clinton. Passada a emoção da vitória histórica, o democrata deverá encarrar o lado negativo do trágico governo que serviu de garantia para sua conquista. Obama terá muito o que consertar.

O novo presidente terá que superar em primeiro momento, os drásticos efeitos que a desaceleração da economia trará logo nos primeiros dias de seu mandato. Junto com as boas novas da mudança democrata, virão os destroços de um mandato duplo recheado de irresponsabilidades econômicas. O mundo exigirá do novo líder um posicionamento contundente, que possa trazer de volta a confiança na nação causadora do cataclisma financeiro.

De Obama também será cobrada uma posição mais humana e correta no que diz respeito à diplomacia. Auxílio aos países pobres, repúdio a guerras, respeito ao meio ambiente, promessas implícitas no carro-chefe da campanha democrata , a mudança. Não é apenas um novo presidente que o mundo quer, mas uma nova "América". Um país que finalmente entre em conjunção com os novos tempos.

É claro que muito do que é pedido, não será feito. Não pensemos que Obama será o messias que nos guiará a um mundo mais justo e feliz. A igualdade racial é uma realidade distante nos EUA e no mundo, bem como a maioria dos sonhos dos eleitores democratas. O governo do novo presidente, como foi o de todos os anteriores, deverá respeitar os anseios das grandes corporações, os verdadeiros partidos políticos que guiam os EUA.

Como dizia uma genial colega de turma ontem, Obama vale mais pelo símbolo que pela prática. Ele pode não mudar nada, mas por si só já representa uma mudança significativa, a da ideologia. Os americanos disseram um não a um candidato que em muitos aspectos é o estereótipo de presidente dos EUA. Ex-militar, branco, bem aparentado, liberal e carismático. McCain, apesar de ser o mais democrata dos republicanos, carregava nas costas todo o peso de uma tradição que caiu em desuso nos EUA.

Ao ver os americanos elegerem a mudança, não pude deixar de lembrar dos cariocas. Enquanto lá o político diferente prevaleceu, aqui preferimos manter o arcaico populismo. Elegemos o calçador de ruas do subúrbio, o distribuidor de santinhos, o construtor de monumentos e praças. Apostamos na candidatura suja nas ruas e nas idéias. Ignoramos o troca-troca do candidato traiçoeiro que fez da sua campanha uma punhalada em seu padrinho político. O resultado, contudo, foi apertado. O balanço das eleições municipais no Rio foi positivo. A política renasceu. O novo não venceu, mas chegou perto, bem perto. Para quem duvidava que as classes mais desfavorecidas inviabilizariam uma candidatura inovadora, 2008 trouxe novos ares de esperança. Gabeira não é Obama, mas é a mudança que Rio espera de braços abertos. É uma pena que o carioca ainda não tenha se convencido disso.