Teoricamente, o oposto deveria acontecer. Após conhecer as maravilhas da abertura de mercado, a população deveria almejar sucesso nas grandes empresas privadas. Contudo, grande parte da sociedade opta hoje pelo antes tão criticado Estado Paternalista. Muito menos empreendedor que o exigido pelo sistema, o brasileiro busca acima de tudo a estabilidade, ainda que com salários menores e funções menos prestigiadas.
A tranqüilidade se sobrepõe então a insana busca pelo sucesso. A alternativa é muito mais lógica. A exploração de mão-de-obra, desvalorizada com crescente exército de reserva, levou a percepção de que a competitividade é um risco para o homem competitivo e reduz sua vida a um só objetivo: qualificar-se. O desejo por salários cada vez maiores continua, mas agora saber que o pagamento estará lá nos próximos anos é mais importante. Talvez a busca seja pela manutenção do poder de consumo, e não pela felicidade em outras áreas da vida, mas é fato que um novo paradigma de sucesso se cristalizou na sociedade.
O brasileiro do início do século XXI prefere ser um burocrata a trabalhar em escalas desumanas de horas-extras, feriados e fins de semana. Dificilmente se encontra alguém que não trocaria sua “possibilidade de crescer com a empresa” por uma pequena carga horária com benefícios, ainda que com salários menores. De que adianta vestir a camisa da companhia se ela não se compromete a vestir a sua?
Astuto, o capitalismo obviamente já encontrou uma forma de se beneficiar com a nova demanda. O mercado de cursos preparatórios ostenta hoje uma gorda participação no setor terciário. Empreendedores gabaritados promovem a nova ideologia, e os questionamentos da “quadrada” ideologia neoliberal parecem ter sido apaziguados. A esquerda pró-estatal ganhou um aliado na luta contra a terceirização dos serviços públicos. Um aliado que na verdade apóia apenas o próprio bolso. Aumentar o estado agora é lucro.
Menos lembradas, as administradoras privadas também têm muito que comemorar. Dificilmente um órgão oferece vagas sem antes contratar uma firma privada para organizar a seleção. O montante de divisas engorda com a demanda por vagas. Os serviços oferecidos vão desde provas a correções e classificações. É preciso estar atento à eficiência da fiscalização.
Conforme os gastos com pagamento de salários crescem, o governo usa mais uma vez o emprego como arma eleitoral. Como ano de eleições municipais, 2008 promete abrir concursos da Prefeitura de Oiapoque à Câmara de Chuí. Apesar do uso deliberado do dinheiro público, o Estado de fato tem o dever de garantir a oferta de empregos. Isso não quer dizer contratar todos os desempregados. Há um ponto de equilíbrio entre a Dama e a Cortina de Ferro que não fundirá os cofres nacionais e, por tabela, os nossos bolsos.
Postos à prova, os governantes tem apenas quatro anos de duração para responder a inúmeras questões. As indisciplinas são muitas, já que o programa não é assim tão claro. Por mais que alguns estejam preparados, a avaliação impõe condições e critérios que podem desestabilizar os nervos e principalmente os princípios dos candidatos, mesmo depois de classificados. As reações são inúmeras. Alguns ficam meio aéreos a viajar sem ler muito bem os enunciados, ou apenas pulando a leitura incômoda. Há quem sinta os instintos mais primitivos e quem perca o salto, a compostura e a vergonha. Muitos pedem cola, até levam as respostas na cueca. Cavalheiros distintos afundam em escândalos. Criam verdadeiros esquemas que acabam descobertos ou não, afinal de contas, o fiscal não é assim tão atento, ou imparcial, quanto diz.
O grande problema é que as opções são muitas, e nem sempre há garantia de que alguma esteja certa. Há perigo no óbvio e no complexo, mas principalmente nas generalizações. Se nenhuma das respostas anteriores foi correta, o melhor é apostar em algo novo. Provas antigas servem para se preparar mais não devem ser a base do estudo. A atenção deve ser redobrada com os cálculos e interpretações, “equívocos” acontecem sempre.
Na corrida por uma vaga mais prestigiada, o Brasil cometeu e comete muitos erros, torçamos para que não anulem os acertos. Cabe a população recorrer caso se sinta prejudicada. O funcionalismo público não deve ser excessivo, mas também não deve ser extinto. Cuidemos para que os políticos não percebam de repente que encolheram o Estado “por acidente”. Aproveitemos nossos dias úteis.